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Além do Ultraman

Autor

adrianaamback

De Ubatuba à Barra da Tijuca: o Ultraman agora é realidade

Fui selecionado para participar do UB515 e a Lúcia (Telles) narra o acontecido.

 

– Somos uma família, o espírito é todo esse. A graça dessa jornada está nesse sentimento de união, fraternidade, confraternização. O percurso não é fácil, são inúmeros obstáculos, dias e noites suplicando por dedicação extrema. Somos simples, sem glamour, sem luxo, pouca infraestrutura. O espírito dessa jornada está também nessa entrega.

Dois sotaques cariocas na linha, no Estado ali ao lado. Olho pra mesa, pras pequenas câmeras no aparelho celular, pros rostos deles que já vi na imprensa, na internet… Aceno com a cabeça para cima e para baixo em cada uma dessas ponderações.

– Sim, eu sei, acho que entendi esse espírito da jornada.

Aceno com a cabeça e com o coração, sim, eu sei e eu quero, quero demais viver isso.

– Os tempos são esses, os dias serão esses, a data já está fechada, o patrocinador ainda não, o trabalho de preparação será este, aquele. Estaremos por perto, ligando, perguntando, querendo saber de você, até o final.

– Bom saber desse acompanhamento, sentir-se cuidado, amparado…

Ao meu lado a janela exibindo a noite já escura, nove horas. E penso em todas as noites que seguirei levantando para ir para o embate. Minha voz falha um pouco.

Uma a uma, cada etapa começa a ser esmiuçada, desfiada, e com essa linha enorme refaço todo o percurso até aqui. Subo à superfície e respiro.

– A água no primeiro dia amedronta muita gente, podemos ver no seu currículo que você tem familiaridade, é nadador, estará no seu ambiente confortável.

– Sempre gostei mais da água, nado desde bebê, eu tinha asma, a natação me curou.

Perco o ar, logo acho de novo. Volta em mim o garoto teimoso que disputou gota a gota de inúmeras piscinas. O mar, as toucas, a roupa de borracha assando o pescoço, o zíper fechando nas costas com meu nome e telefone, a saída tumultuada para o mar, sempre um pé na frente e já outro atrás pronto pra te atropelar, a saída pé na areia, as provas da infância. Refaço todo esse caminho rapidamente. Falam do meu currículo, uma sequência de experiências aquáticas, as primeiras experiências esportivas, com esse espírito da competição, mas mais que isso, com essa relação profunda com o esporte que trago em mim. Penso que de caldo não morrerei na praia… E, então, lembro do mar que conheço, do litoral que frequento há muitos anos, águas já sabidas por mim.

Volto às câmeras, eles lá, já falando da longa jornada do ciclismo.

– Todo o percurso numa estrada muito bonita, cercada de Mata Atlântica – Ubatuba, Paraty –, numa estrada sem muita infraestrutura, não teremos médicos ou ambulâncias, mas indicamos todos os centros de saúde e hospitais que estão por perto.

O vácuo, as rodas abertas – não vale fechada –, o cuidado com o carro de apoio, atrás, nunca ao lado, o trânsito que segue sua rota, como se nada estivesse acontecendo, e o power meter me dizendo quem são minhas pernas. Sigo ouvindo.

– Sim, eu quero, eu vou!

– Seu currículo mostra uma preferência por esportes de resistência e força, e não velocidade. Você está no lugar certo.

– Que bom ouvir isso, também acho, estou no lugar certo, estou, sim.

Vou me animando e sendo tomado por uma explosão de ansiedade, o corpo meio adormecido com a chegada da boa notícia, como esperei essa ligação…

Para ouvir falar da corrida me ajeito na cadeira e penso em minha última experiência: um recorde pessoal, uma maratona com tempo excelente, mas só a metade do que terei por lá. Sinto uma certeza de que posso fazer, sim, duas vezes aquilo.

– Ao final da corrida temos a linha de chegada que pode ser um pórtico construído ou uma linha pintada no chão, para nós as duas possibilidades existem e têm o mesmo significado, ainda não fechamos os patrocínios.

Linha pintada no chão fica na minha cabeça, logo lembro das provas de triatlon antigas que já vi e que eram assim, entendo melhor esse espírito simples e clássico a que eles tanto se referem, me nutro completamente dessa energia.

– Sua família precisa estar muito perto, sua esposa, suas filhas, seus amigos. Todo mundo junto pra te apoiar durante, mas principalmente no processo, nos meses e dias até lá. (Todos com Renato!) Temos ainda 8 meses.

Penso nelas, nos meus amigos, nos companheiros de treino, na minha equipe, falo bastante deles…

– Sem eles eu não conseguiria, nem querer, quereria! O apoio, a segurança. Tenho um time muito coeso, presente. Apresento a equipe que me acompanhará, o capitão e toda a tripulação que comandará comigo esse trem maluco que resolvi dirigir.

Eles ressaltam eixos importantes e repetem palavras: Kokua, Ohana, Aloha.

Solidariedade, família e amor. Penso ainda em companheirismo, autoconhecimento, superação, garra. E me vejo sendo isso, cumprindo esses eixos, de Ubatuba à Barra da Tijuca, nadando os 10 quilômetros mais fundos da minha vida, pedalando os 421 com toda minha dedicação e amor e correndo os 84,4 munido de enorme superação e autoconhecimento. Eu quero, e eu posso, agora, acabo de saber que posso!

Lembro da minha companheira me contando que no latim “ultra” quer dizer “para além de”, e, intuitivamente, me vejo nesse lugar, experimentando a posição de estar aqui podendo estar além.

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Enquanto elas dormem…

“Enquanto elas dormem…” é uma crônica escrita, com inteligência e delicadeza, por quem observa minha vida de atleta de perto: Lucia Telles, minha mulher.

 

As três dormem. Piso leve pra madrugada não atravessar o sono delas. Ainda a madrugada me chamando pra mais uma vez, como tem sido em tantos anos, ver a luz se fazer. A meia, o tênis, a bermuda, os incontáveis bolsos nas costas, o boné. Cuido da provável sede, fome, encho garrafas com todos os pós que inventaram em forma de alimento, hidratação… Alma alimentada, confiante. Preso no corpo um número que agora me identifica, a essa altura, do um ao mil, já fui uma porção de combinações, todas penduradas na parede de cortiça, uma espécie de altar com os louros dessa caminhada que se inicia pelas incontáveis madrugadas. Chamo um táxi. Aguardo na mureta do prédio tomado pela conhecida sensação de frio na espinha, silêncio, ansiedade, segurança e insegurança dançando juntas em um corpo de baile esquizofrênico, mas que me faz bem, me revigora. Parto pra batalha. Deixo as três dormindo.

O caminho é de silêncio, a cidade acordando de um sábado qualquer, a luz do sol que promete, aquele sopro frio do fim da noite, o silêncio do corpo que sabe que será exigido, se preparando. Agora já não piso mais tão leve, a chegada me desperta para o que virá, um mar de gente na correnteza ansiosa, barulhenta, enérgica. Passam os cremes contra o sol, o sal, ajustam cadarços, óculos, bonés, uma parafernália simples que auxilia na ansiedade, na confiança, fazer uma boa prova. Largo cedo e antes mando mensagem reivindicando a presença das três na chegada, nenhuma resposta, ainda dormem por trás da mureta do prédio.

O começo é tão feliz, tão maluco… Adrenalina de criança, como um brinquedo recém alimentado com pilhas, saio forte, agora pisando firme, um passo após o outro numa mecânica ainda bem organizada, olho em volta, sem ver muito o que está em volta, agora é olho pra frente, com o olhar pra dentro.

A cada quilômetro uma imagem da cidade que conheço e não conheço. Árvores, avenidas, pessoas, cachorros, casas que já vi e não vi, um cenário pros pensamentos que correm soltos, chamando os músculos e nervos pra correrem também. A maratona mental é capitã da embarcação que leva o corpo, se ela navega fluente e tranquila chegamos ao cais. Isso eu já sei, busco essa navegação.

Ouço de canto as conversas, as risadas, os suspiros. Reparo nas cabeças altas, baixas, nas cores das roupas, nos dizeres dos uniformes, no ritmo de quem vai passando ao lado, de quem vai ficando, em minha respiração que aumenta a frequência, em meus poros que começam a trabalhar, o corpo molhando, esquentando. Bebo o líquido que me oferecem, fico grato, como se fosse uma ceia servida a um combatente, aceito todos os líquidos que me oferecem com essa mesma gratidão. Aos poucos percebo que ganho um ritmo excelente, que estou bem, que as pernas querem seguir, que o coração trabalha corajoso e passo pra segunda parte satisfeito e orgulhoso, a cidade já se exibe com o sol a pino, sigo prestando atenção nas cores, vozes, pessoas, cachorros.

Penso nas três, que já devem estar acordadas, e o coração trabalha feliz com esse pensamento. Não olho o relógio, não preciso saber pela máquina o que sei internamente: estou forte, estou bem!

Os amigos que passam, apoio recíproco, os conhecidos acenando, refaço as ligações com cada um, quem são, que provas fazem e fizeram. Penso na minha prova meta, ganho mais força, vontade de acelerar, seguro, lembro do técnico pedindo constância e não explosão. Penso na prova meta e me dou conta que não fiz nem um terço dela ainda. Segurança e insegurança se anunciam novamente, mas o coração, o pulmão e as pernas seguem corajosos, confiantes.

Percebo que estou na segunda parte mais forte do que estava na primeira, sensação nova, revigorante, reenergizante. Sigo aceitando as ceias oferecidas, grato.

Não penso em quilômetros deixados, nem nos que faltam. Deixo a cabeça livre, voar, e mantenho os pés fincados ao chão da cidade, no asfalto irregular.

Nos últimos quilômetros a grata surpresa do amigo presente, lado a lado, me transporta pra assuntos que me confortam, os treinos, as provas, as metas. Conversa leve, solta e vou que vou, como se estivesse começando, sem a noia do cansaço final, do medo de não ver a borda. Vou que vou.

O pórtico se anuncia e sinto que ali tenho um recorde, superação das próprias vivências, experiências. Sinto que estou vencendo a mim mesmo, que posso e poderei chegar à borda com todas as forças do mundo. Passo, sorrindo, satisfeito e ouço meu nome, na voz conhecida, relaxo. Elas estão lá, surpresas também, felizes.

Tudo feito, ganho. Agora só quero descansar pra próxima, com uma força e vitalidade inexplicáveis. Agora só quero voltar, e antes da madrugada ver as três dormindo novamente.WhatsApp Image 2017-08-08 at 12.21.59

Expectativa x realidade

Dizer que comecei o Ironman Florianópolis sem nenhuma expectativa é uma meia verdade.  Apesar dos meus técnicos terem sido contra, coloquei na cabeça que poderia fazer um tempo abaixo de 10 horas. Afinal, era minha oitava participação e, nos últimos anos, tinha mantido uma constância: 10h22, 10h14, 10h16, 10h17. O que era uma virtude.

No fundo, minha expectativa era fazer uma prova perfeita com uma corrida boa, como faço nos treinos. Das três modalidades, a corrida é minha maior dificuldade.

Já no quilômetro 19 da corrida, comecei a sentir que meu plano não era tão perfeito assim… Nos próximos dez quilômetros segui meio cabisbaixo, meio desapontado e num ritmo mais lento. Percebi que não daria para atingir o plano que tracei. Mas no quilômetro 28 voltei a correr num ritmo razoável até terminar a prova.

Resultado: fiz a prova em 10h25min. Onze minutos acima do meu melhor tempo.

Impossível não sentir certa frustração. Apesar de saber que o Ironman é mais uma etapa do processo e que não realizei uma prova ruim, do ponto de vista pessoal, gostaria de ter ido melhor.

A expectativa é um assunto complicado. A teoria é uma coisa, a realidade é outra. Durante a prova, você faz o melhor que pode naquele momento. Sem esquecer que momentos ruins e momentos bons se alternam.

Mais tarde, quando olhei para os tempos do Ironman Florianópolis percebi que não tinha ido tão mal assim. A média entre homens e mulheres foi de 11h40min. O tempo médio dos homens 11h34min e das mulheres 12h22min. É bom olhar um assunto por outro ângulo.

No final, percebi que fiz um ótimo treino e que agora é aprender com os fatos, tirar as coisas boas, que não foram poucas, e seguir treinando. Em menos de 8 semanas tenho outra maratona pela frente para tentar evoluir e fazer melhor.

ROC17IMF0169Meus números no Ironman 2017:

natação – 52min

ciclismo – 5h15min

corrida – 4h07min

transição 1 – 4min

transição 2 – 3min

total – 10h25min11s

Nutrição: mais um desafio

Mudar hábitos alimentares não é coisa fácil. Comer de três em três horas, ingerir comidas naturais e menos alimentos industrializados… Desde o início desta jornada, sabia que a alimentação seria o ponto mais difícil. Ainda bem que conto com a ajuda da nutricionista Fernanda Palma, focada em melhorar meu desempenho.

A nutrição é fundamental nas provas longas. Na nova rotina que estou construindo, é importante que a alimentação diária seja feita em intervalos curtos, principalmente para acostumar o corpo que está sempre gastando o que consome. Se comer muito com grandes intervalos, o corpo armazena gordura/alimentos, pois não sabe quando será a próxima ingestão de energia. Com uma rotina adequada e com intervalos menores, meu corpo se acostuma a comer e gastar, comer e gastar. Ajudando a digestão e a produção de energia rápida. Daí a importância de comer alimentos corretos em horários determinados. De uma maneira geral, antes do treino: açúcar e carboidrato. Após: proteína.

Tudo está sendo testado visando o Ultraman: a quantidade ingerida por determinado tempo, qual o melhor tipo de alimento, sólido ou não, doce ou salgado… Assim, na hora da competição estarei acostumado a manter meu “tanque” constantemente abastecido e a me recuperar e estar bem no final de cada dia.

Porém, entender a teoria é fácil, a dificuldade está na prática. Acabo cometendo vários deslizes e comendo coisas erradas nas horas erradas. A um ano da prova, estou melhorando, mas ainda longe da perfeição. Sigo nessa batalha que para mim carrega uma dificuldade maior que a dos próprios treinos. Mas aos poucos estou descobrindo alimentos que me agradam, são nutritivos e me ajudam a estar pronto para o próximo treino, pois o maior problema não é a ingestão de calorias e sim os alimentos não nutrirem meu corpo para estar pronto para render o melhor possível na próxima sessão de treino.

Olhando para trás, vejo que já errei na nutrição e mesmo estando bem treinado tive péssimo resultado. O contrário também já aconteceu, uma nutrição correta com menos treino me rendeu uma excelente prova. O ideal é acertar tanto o treinamento quanto a nutrição. Trabalhamos para isso.índice

A cabeça transforma

Depois de participar da Maratona de São Paulo, foi difícil voltar à minha rotina. Fiquei mais de uma semana sem conseguir treinar direito, fazendo apenas treinamentos leves.

Foi complicado lidar com a frustração por não ter conseguido fazer o que planejei e, como consequência, controlar o que passa pela minha cabeça e o que sinto.

Sabia que não iria ser fácil manter o mesmo ritmo por muito tempo. A Maratona chegou depois de dez semanas ininterruptas de treino. Estava mantendo um ritmo forte e fui para a prova pensando que só iria correr 42 km. Mas 42 km é uma distância bem desafiadora. Nunca é fácil. O resultado não foi catastrófico ou horrível, mas acabou mexendo comigo. A isso se juntou o cansaço acumulado.

Nas semanas depois da prova, precisei sair de um lugar incômodo, cheio de maus pensamentos. É muito difícil explicar para vocês como a cabeça rege a nossa vontade, o nosso corpo. Um dos objetivos do projeto é mostrar como o corpo muda, mas é a cabeça que faz esse corpo mudar. Para isso, ela tem que estar forte, preparada e consciente para que tudo aconteça de uma maneira legal. Estou aprendendo a lidar com tudo isso com a ajuda do Arthur, meu psicólogo.

No feriado de Tiradentes, voltei a fazer treinamentos longos, visando agora o Ironman Brasil, que acontece no dia 28/5, uma prova intermediária para o nosso projeto.

Estou de volta. Aos poucos, eu chego lá.

Na estrada

Camaradagem, imprevistos e histórias divertidas fazem parte da rotina do treino de estrada. Sempre tem alguém que acaba com o pneu furado, sem água ou que não consegue pedalar até o fim. Essas pequenas adversidades, comuns em um treinamento longo, unem o grupo, que varia de 5 a 6 pessoas.

Outro fator que gera uma irmandade forte é a proteção contra os perigos: carros em alta velocidade e caminhões incomodados com a nossa presença. Tanto que para quem olha de fora a sensação é de que somos amigos de longa data. Em muitos casos, somos apenas colegas, unidos por aquela situação.

Quando comecei a participar de provas de triathlon, pedalava 30 km e achava o máximo. Hoje, rumo ao Ultraman, já alcancei a marca de 200 km. Porém, o mais importante não é a distância em si e sim a frequência com que é realizada. Nesses últimos dois meses, consegui pedalar entre 130 e 180 km quase todos os fins de semana.

Os treinos na estrada são muito importantes porque simulam a realidade de uma prova em pontos cruciais: ritmo, alimentação e potência. Caso algum desses itens seja realizado de maneira errada, a conta chega antes mesmo do final do treino na forma de câimbras e falta de força. Aqui aprendo também a testar meus limites: onde poderei arriscar ou terei que tomar mais cuidado. Se me arriscar e não tiver sucesso, dificilmente terei boa performance na prova.

Na volta para casa, depois de cerca de seis horas pedalando, o cansaço é imenso, mas a sensação de mais um treino realizado e do conhecimento adquirido, vale cada gota de suor.

Depois de 13 semanas, faltei apenas uma vez.

Até o próximo treino, sempre em busca de limite, autoconhecimento e aprender a extrair o melhor de mim mesmo.

Montanha russa

Quando vemos as conquistas de um atleta ou de uma pessoa que treina atrás de um objetivo, só enxergamos a linha de chegada. Muitas vezes não conseguimos visualizar o caminho e as dificuldades trilhadas.

Apesar de estar nas semanas iniciais de treinamento, já deu para sentir uma montanha russa de sentimentos e sensações. Tenho momentos de euforia, quando tenho certeza de que tudo dará certo, e outros difíceis, em que penso jogar tudo para cima.

O processo é longo e me pergunto se chegarei até o fim diante dos obstáculos que encontro pela frente: estar motivado o tempo todo, ultrapassar limites, seguir as orientações nutricionais e manter a equipe se comunicando o tempo todo. Além disso, tento dividir minha vida em três partes: profissional, familiar e esportiva. É difícil porque sou uma pessoa muito intensa.

Nesses momentos, conto com o psicólogo do esporte Arthur Ferraz. Ele me ajuda, diante das horas difíceis, a não me deixar abalar tanto e, nos momentos de euforia, a não perder o foco e sair do que foi planejado.

O mais importante é ter uma rotina de treino consistente. Não adianta fazer um treino bom e três treinos ruins. Então, cada dia coloco um tijolo para construir uma casa forte e sólida. E tento me apegar e me apropriar dessa ideia.

Sigo meus treinos, confiante que estou no caminho certo. Procuro aprender a superar os pontos fracos e a melhorar os pontos fortes.  E agradeço muito à minha equipe que tem me ajudado a encontrar o equilíbrio necessário entre cobrança, empenho, diversão e foco.

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Ironman x Ultraman

 

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Muita gente me pergunta qual a diferença entre treinar para o Ironman e para o Ultraman.

Estou acostumado a fazer ciclos de treinamento menores, com duração de 16 semanas, específicos para o Ironman. Neste momento, treinar para o Ultraman não está sendo muito diferente de todos os ciclos que já fiz. A explicação é simples. Além de não ser eficaz, meu corpo não aguentaria um volume tão grande de treino faltando tanto tempo para a prova (abril de 2018). Então, minha rotina permanece quase a mesma. A diferença é que estou descansando menos após os treinos longos. Em vez de dar uma parada, faço treinos leves.

Isso acontece porque preciso aumentar meu poder de recuperação. Para vocês terem uma ideia, depois de uma maratona, fisiologicamente falando, o corpo precisa de 3 meses para se reestabelecer completamente do desgaste. O ideal seria ficar cerca de 7 dias parado e voltar a treinar bem leve e, depois de 45 dias, com alguma intensidade.

Estou treinando meu corpo para não ter esse descanso e tentar se recuperar o mais rápido possível. O Ultraman consiste em três dias de prova com no mínimo 9 horas de atividade cada dia, enquanto numa maratona estamos falando de 4 a 5 horas. Não haverá tempo para a recuperação. Portanto, meu corpo tem que se acostumar a trabalhar cansado e conseguir fazer força mesmo não estando cem por cento. Esse ano de treinamento irá criar uma base para que eu aguente essa carga.

Somente a partir de janeiro de 2018 o treino será muito diferente. O volume irá aumentar consideravelmente a partir de uma base já adquirida. Até lá o que preciso é consistência.

O primeiro Ironman

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Florianópolis, 2012. Acordo às quatro e meia da manhã, arrumo minhas coisas e caminho em direção à praia. O sol começava a nascer no horizonte. Seguia com medo porque sabia que estava remando contra a maré ao tomar a decisão de participar pela primeira vez do Ironman onze meses antes. Meu treinador, por exemplo, achava que precisaria do dobro de tempo de treinamento. Para complicar a situação, nunca tinha pedalado e muito menos corrido mais de 5 km. Em compensação, contava com o suporte da família: mãe, esposa e filha de 1 ano e cinco meses estavam presentes.

A primeira prova, 3,8 km de natação, não seria parâmetro para o resto da competição. Afinal, natação era o meu forte. E foi o que aconteceu, saí do mar entre os 20 melhores nadadores, junto com o atleta que foi campeão do Ironman. Animado por ter nadado bem, corri para pegar a bike e percorrer 180 km.

Naquele momento, aconteceu um fato engraçado. Peguei a sapatilha que estava na bicicleta e só naquela hora, olhando para os competidores a minha volta, percebi que não sabia colocar o calçado com a bicicleta em movimento. Com muita calma, sentei no meio fio e coloquei a sapatilha. As pessoas me olharam sem entender nada.

No início, me sentia tranquilo e achei que a prova estava sob controle. Depois de 150 quilômetros, a situação mudou, não estava aguentando mais pedalar. O vento e o calor foram minando minhas forças. Começou, então, uma negociação com a minha mente. Ela me dizia para parar, enquanto eu só pensava em continuar e cruzar o pórtico de chegada. Aprendi depois que essa negociação faz parte de todas as provas de longa distância, que são muito mais mentais do que físicas. E ela durou até o final.

Depois vieram as cãibras . A vontade era colocar os pés no chão e sair correndo. Mas segui em frente e entreguei a bike 40 minutos depois do planejado. A sensação de cansaço era enorme.

Faltava a última prova, 42 km de corrida. Depois de 14 quilômetros, passei a caminhar para descansar um pouco. Quatro quilômetros mais tarde, senti muitas cãibras e enjoo forte. Naquele momento, pensei em largar tudo. Porém, o acaso aconteceu. Como o hotel que escolhi ficava longe, quando já estava administrando a frustração de não conseguir atingir o objetivo, vejo minha família dentro de um taxi gritando: “Vai Renato, você está bem, falta pouco”. Fiquei muito emocionado. Depois, levantei a cabeça e pensei: “Eu não vou desistir, nem que eu saia daqui carregado”. Consegui voltar a correr, alternando com alguns momentos de caminhada.

Depois de 13h53’53’’, cruzei a linha de chegada. Um dos momentos mais lindos e felizes da minha vida, que dividi com minha esposa e filha. A concretização de um desafio que para muitos parecia impossível, mas que consegui realizar com o apoio das pessoas certas.

Fiquei um pouco decepcionado por não ter feito um tempo melhor, pois tinha treinado para isso. Mas não levei em conta que o corpo precisava ter marcas para conseguir colocar em prática o que fiz nos treinos.

Foi uma experiência inesquecível. Além de todo aprendizado e autoconhecimento, descobri que ter uma família que te ama e apoia, pode levar você a lugares nunca antes sonhados.

 

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